- Não sei, tem tanta coisa para ver hoje – respondi sem
conter minha felicidade infantil de estar ali.
-O certo seria a gente ir à roda gigante, mas acho mais
legal fazer algo entre nós três antes – Mi sugeriu, sabendo que naquele troço
enorme que roda eu não iria mesmo, por mais bonito que estivesse. Num só som,
Nick e eu exclamamos:
-CARRINHO DE BATE-BATE!
Mi simplesmente entrou no clima, compramos diversas fichas e
competimos a fila com crianças e seus pais. Cada um ficou em um carrinho
diferente e pelo que me lembre, o meu era amarelo. Batíamos uns nos outros como
loucos e gargalhávamos escandalosamente, principalmente quando Nicolas tomava
duas pancadas de uma só vez e saltava para cima, o que lembrava um frango em
desespero (acho que foi assim que uma garotinha o descreveu depois que saímos
cambaleantes da pista).
Depois fomos às xícaras gigantes que giram até a exaustão,
mas nem teve tanta graça porque não era permitido entrar dois maiores de 13
anos juntos, então cada um de nós foi com uma criança que esperava na fila,
para o alívio da labirintite de seus pais.
Mi implorou para que Nick lhe comprasse uma maçã do amor e
no fim estavam os dois brigando por mordidas melecadas.Então a tal roda gigante. Os corações batiam forte e os sorrisos brotaram no rosto de Mi e Nick quando eles se olharam. Fiquei apenas no meio sem ter o que fazer, afinal, apenas esperaria os dois. Remexia nos meus bolsos da calça enquanto os dois se continham em si mesmos, esperando sua vez de matar a saudade do brinquedo que marcou o que era ser criança.
Enfim, chegou a vez deles.
- Chegou a grande hora! –disse levantando as sobrancelhas e
mostrando os dentes.
-Esperei tempo demais... – Mi olhou para mim com uma ternura
que não entendo até hoje. Vi Nick entrando no brinquedo e olhando para nós,
como se chamasse Mi com os olhos. E ela fez uma coisa que não esperei,
novamente. Não vi como, apenas senti. Quando vi, ela estava nos meus braços,
num abraço quente e acolhedor, sentia-a pequena, frágil, menina. Sua cabeça
estava abaixo de mim, sob meu peito, e eu a abracei apoiando meu queixo no alto
de sua cabeça loura escura.
-Du... Amo você, tá?
-Eu sei, Mi. Também a amo.
Ah! Se eu soubesse o que significava aquele abraço...Nossos corações palpitaram por um segundo e lhe beijei na testa, quando Nick a gritou para se apressar. O funcionário colocou-lhes a barra de segurança e lá se foram eles, girando em sentido anti-horário. Afastei-me pra observá-los melhor. O que via, porém, não era nada do que eu esperava para os dois. Eles não riam como dois patetas, não apontavam para todas as direções, nem balançavam as pernas sobre o piso de base que se estendia um pouco à frente do acento. Eles conversavam olhando um para o outro. Na verdade eu via apenas o Nick, pois Mi estava de costas para mim. De repente, a boca de Nick parou de se movimentar e ele sorriu meio sem jeito, olhando para suas pernas. Então lá do alto, no ponto máximo da roda gigante, ele a olhou novamente, pôs a mão esquerda no pescoço de Mi, por baixo dos cabelos, fechou os olhos lentamente e... chão.
Olhei para o chão, pois aquilo era um monte de confusão, mas
eu estava absurdamente feliz com aquilo, como se fosse a coisa mais certa e que
mais fazia sentido no mundo. Mais para o lado direito agora, eles ainda se
beijavam, e de repente coisinhas pequenininhas sobre Mi se encaixaram e um
tiquinho da alma daquela menina fez sentido. Sabe-se lá por que ela não me
disse nada, ou se disse com atos, como não percebi. Mas ali, no momento, era
como se eu soubesse e só quisesse que aquela imagem fosse eterna.
Mais uma volta e, no mesmo lugar em que iniciaram o beijo,
pararam. Vi Mi se virar de costas para Nick agora, morder o lábio e sorrir ao
mesmo tempo, com a ponta de dois dedos sobre os lábios, com os olhos fechados,
como se aquilo tivesse sido esperado por... “tempo demais”. Então ela abaixou a cabeça, deixando o cabelo
cair sob o rosto, e assim ficou enquanto Nicolas tinha um sorriso muito idiota
na cara. Tudo isso num tempo devagar demais para ser de verdade. Eu assisti
tudo o que se passou a partir dali como num filme, como se eu esperasse
acontecer mesmo sem saber o que seria dos fatos.
E o brinquedo parou. Nick esperou o funcionário vir levantar
a barra de segurança para eles saírem, mas Mi disse que queria ir novamente,
percebi pois ela nem ao menos se levantou, entregando outra ficha ao funcionário,
que lhe permitiu brincar novamente devido às poucas pessoas na fila. Eu
continuava olhando um pouco afastado enquanto Nick vinha em minha direção com
as mãos nos bolsos, ainda com aquele sorriso de canto. Quando ele ficou ao meu
lado, apenas dei-lhe um soquinho no ombro sorrindo, ao que ele respondeu
corando. Quando o funcionário terminou de abaixar todas as barras, ligou o
brinquedo, ao que Mi nos olhou e acenou com a mão sorrindo.
Acenei de volta. Nick sorriu.
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