quarta-feira, 2 de maio de 2012

Círculo de Cores pt II

Foi a partir da segunda semana de fevereiro que as coisas começaram a ficar estranhas.

Nossas aulas começaram e tudo parecia mais difícil considerando o fato de que poucos de nós tiveram sequer contato com a própria escrita durante as férias. As datas dos trabalhos logo se acumularam na lousa, tudo absurdamente rápido, etiquetando nossa preguiça com seus prazos. Nada tinha mudado apenas o fato de duas pessoas novas no colégio: um garoto magrelo com jeito de espertalhão do tipo que consegue hackear qualquer sistema, que preferia ser chamado de Duka e uma menina sem graça que nunca soube o nome, que escondia o rosto sob os cabelos.

Ninguém dava muita importância para a escola ainda. O carnaval na cidade prometia ser dos bons, pois o último tinha fervido horrores e os turistas certamente voltariam com mais gente. Eu mesmo acabei me entregando à festa da carne a vagar no outro ano, quando fiquei bêbado com o Nick pela primeira vez, e foi quando ele admitiu de vez para si mesmo que carregava o inferno nas costas pelo amor de Achila.
Com a festa toda montada na cidade e os hotéis juntando turistas, voltávamos eu, Nick e Milena da escola, sem o peso de ir para a escola durante toda a semana. Milena organizava consigo mesma qual dos trabalhos faria no feriado, enquanto eu e Nick, como perfeitos idiotas, brincávamos de trocar socos e pontapés na rua, xingando um ao outro e achando tudo muito engraçado.

- Parem de ser bobos, vocês são crianças demais um com o outro e comigo, não dá pra entender.

- Ah Mi, é divertido, você sabe que sempre foi nossa forma de demonstrar amizade – respondeu Nick dando um peteleco na orelha de Mi com os dedos.
- Na frente das outras garotas vocês são perfeitos gentlemen, pensam que não vejo?

- Poxa, é diferente né Mi... É que sei lá... Você é você, entendeu? Você não é uma garota. Quer dizer, é, mas... Não sei, você é a Milena, entendeu?

É. Ela era uma irmã, não dava para nos ver romanticamente com ela, era o tipo de ideia impossível. Depois disso todos continuaram a andar em silêncio, Mi olhando para o chão, Nick chutando uma pedrinha e eu procurando o que dizer.
- O prefeito disse que o dinheiro arrecadado com o carnaval esse ano vai ser investido em obras para a cidade, e como provavelmente vai lotar de gente, talvez sobre dinheiro para a reconstrução do parque. Vocês viram?

Acho que foi a melhor coisa que Milena e Nicolas ouviram na semana. O parque de diversões foi desativado há três anos, quando os funcionários fizeram greve e ninguém se importou. No fim das contas, parou-se de investir nas máquinas e sua manutenção, e o espaço foi ficando abandonado, sendo ponto de encontro para drogados ou casais safados. Nick e Mi amavam a roda gigante, sempre que entravam rodavam inúmeras vezes. Eu tenho medo de altura desde sempre, então acabava indo ao carrossel enquanto os dois paspalhões riam escandalosamente nas alturas. Ambos agora torciam de dedos cruzados para que os turistas viessem aos montes enquanto riam e diziam que juntos estreariam a nova roda gigante.
O sol já causava ardor em nossas peles e a fome agredia os estômagos. Milena seguiu o caminho de sua casa, e Nick me acompanhou até a minha. Ele só faz isso quando quer conversar sobre algo importante, mas dessa vez ele não disse nada. Fiquei esperando e até fiz certa pressão, mas ele só disse que queria passar um tempo a mais do meu lado. Como se na época ele soubesse que estávamos a um passo de bocas cheias de nada para dizer.

- Vai à festa esse ano, Du? No carnaval...
- Nem sei, minha mãe ficou muito fula quando descobriu que bebemos, dessa vez ela vai ficar em cima. E também tenho que adiantar os trabalhos...

- Sei... Vou com a Achila. Ela participa de um bloco, acho que vai ser maneiro.
- Toma cuidado, mano... Sei lá, leva umas camisinhas, não sei...

- Sei lá, não está assim também, e vai ter um monte de gente loucona, também vou beber pra caramba, mas não acho que...

-Sei. Sabe se a Mi vai?
- Sei não... Então... Vou nessa. Depois te pago o trabalho que pedi pra você fazer pra mim, tá?

- Você nunca pagou os outros que te fiz, Nicolas.

- Eu sei.

Nenhum comentário:

Postar um comentário