terça-feira, 8 de maio de 2012

Círculo de Cores pt IX (final)


Um mês depois, tomei coragem para ir a sua casa. Seus pais deixaram tudo como estava antes, dizendo que não tocar na ferida faz parte da cicatrização. Eu queria pedir a bolsa jeans. Só isso dela que eu queria. Fiquei satisfeito quando seu pai passou o objeto para minhas mãos, onde fiquei longos minutos apreciando os penduricalhos. Antes de sair, num ato automático, olhei para a estante das bonecas.

Vazia.

Passadas algumas semanas, quando já não dormia mais agarrado com a bolsa vazia, decidi que precisava continuar a viver, apesar de.
Resolvi colocar a bolsa em cima do guarda-roupa, onde olharia apenas quando meus olhos fizessem questão de lembrar. Toquei a caixa menor que havia sobrado naquele dia em que Mi arrumou meu quarto, e num ato curioso, a abri. Barbie. Em vestido rosa brilhante. A última que sobrou de sua meninice.

E, bem, foi isso que eu vi. Depois daquela quarta feira de julho, tudo o que precisou ser feito assim o foi.

Psicólogos foram pagos para os presentes na cena, inclusive para Nicolas e eu. Mas não acho que tenha adiantado de muita coisa.

O parque ficou fechado por um tempo, mas retornou a suas atividades conforme Milena caía no esquecimento.

Nicolas e eu nunca falamos muito sobre isso. Nick ficou um mês sem falar absolutamente nada com ninguém e emagreceu muito, o que denunciava sua falta de apetite.  Ele nunca me contou o que sabia. O que você leu aqui é apenas o que eu, Eduardo Martins, sei. Apenas o que vi em determinado tempo no espaço.

Seu egoísmo e poder demais (decidir privar-se de viver). Porque ela não morreu. Suicidar-se é um corte muito mais dolorido e complicado de costurar.
É uma verdadeira pena. O que aconteceu com ela. Com todos nós e nossos jeitos pesados de continuar a viver. Apesar de.

E não importa com quem eu fale ou as perguntas que eu faça, ela sempre vai ser uma incógnita. Milena Linzzaro vai ser sempre essa dúvida, esse quebra-cabeça cheio de peças faltando.

E tanto faz em quantas vezes eu pense naquele dia, é sempre a sensação do abraço do Nicolas que permanece em mim. Naquele abraço em que não soltamos na tal noite. Aquele abraço em que o fiz dormir na sala da minha casa enquanto passava os dedos em seus cabelos lisos e a última coisa que vi foi a marca da sua última lágrima do dia manchar minha calça.

Eu nunca vou entender sua decisão de ir embora da vida.

2 comentários:

  1. Nossa isso me ver o quando amizade é a melhor coisa que temos na vida... o nosso maior tesouro. Me fez ver a vida de um outro angulo, melhor coisa que eu já. "por que não sou muito de ler". Então de todas as coisas que eu li. Essa foi a unica que mexeu comigo de verdade

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  2. Quão lindo isso ficou?
    E eu aqui pensando que não iria chorar da segunda releitura.
    MUHAHA adivinhei que ia ter suicídio!
    (Na verdade foi bem mais que um suicídio)

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